quinta-feira, 28 de junho de 2018

Professores, irmãos na criação de gente melhor



Entraram os alunos do meu país, por esta altura do ano, em época de exames e matrículas, e em época de férias - ambas afetando rotinas pessoais e familiares com alterações de monta.

Estão os professores do meu país nestes dias em greve, num ato simultaneamente de luta e de invenção de momentos de convívio democrático entre profissionais, incluindo organização de fundos de greve em cada escola, a escuta entre si de posições diferentes, razões e argumentos, harmonizando reuniões e rotinas, o que não é, de todo, de somenos importância. Para quem trabalha, e para quem educa - também educamos pelo exemplo, como se sabe.
Vão os professores do meu país saber, no próximo dia 6 de julho, os resultados de um estudo sobre o desgaste na profissão docente, apresentado em Lisboa - ver aqui

Com estes dias, e outras coisas, na ideia, e vagabundando por bibliotecas, salta-me para as mãos um  título notável de 1966, Educação Estética e Ensino Escolar, voluminho publicado pela Europa-América com prefácio de Delfim Santos e contributos inestimáveis de João dos Santos, Nikias Skapinakis, João de Freitas Branco Luis Francisco Rebelo e Rui Grácio.

A leitura abre-nos sempre janelas e veredas...
Em algumas das páginas deste título notável, embora hoje difícil de encontrar, mesmo em bibliotecas e desaparecido das livrarias há muitas décadas, Rui Grácio refere os professores, e como sempre são sábias as suas palavras
"Não se pode pôr o problema do ensino escamoteando o da preparação dos professores. Todos sentimos a necessidade de que seja revista a qualidade da preparação cientifica e reforçada a preparação psiopedagógica dos professores, não havendo razão alguma para isentar dela aqueles a quem injustamente se atribui menor responsabilidade educativa, tais os professores das denominadas "disciplinas auxiliares". Como se a eficácia da função educativa dependesse mais da natureza da matéria ministrada o que da forma como ela é aprendida, da personalidade do professor e do teor das relações que se estabelecem com o corpo discente!
(...)
Formar professores e apoiar depois a sua atualização pedagógica e científica de forma a que, diplomados não fiquem entregues apenas a si mesmos, tal como hoje acontece à maioria deles: desamparados de uma autêntica orientação pedagógica oficial, pois o serviços mal parecem chegar ao expediente administrativo; carecidos ainda do apoio que poderia dar-lhes uma Sociedade de Estudos Pedagógicos que já houve e que agora não há. Por outro lad, e finalmente, também não existem adequadas formas de convívio profissional dentro dos próprios estabelecimentos de ensino.
Dir-sei a que entre nós prevalece a cândida convicção, quando não é sofisma, de que "magister non fit, sed nascitiur". Ora, se de algum modo o professor nasce, todavia ele faz-se. E nunca pode considerar-se feito. Mas não há praticamente nenhuma forma eficaz de assegurar que os inexperientes se enriqueçam com a experiência dos experimentados, e que o eventual ancilosamento dos experimentados no cepticismo e na rotina beneficie do ímpeto entusiástico de quem começa; nenhuma forma de garantir que a juventude perene de velhos professores possa abalar a renúncia precoce de colegas mais novos, enrolados com íntima alegria ou doce resignação o invejado hino de uma situação assegurada para todo o sempre. A clarividência de alguns, de entre os melhores, leva-o a aproar a outros rumos profissionais ou, se ficam, a buscar refúgio e compensação num carreira intelectual, confessando, como se ouve às vezes confessar com  alegria matizada de amargura, a íntima satisfação de se sentirem cada vez menos professores.
Queremos fazer das crianças, dos adolescentes, homens sensíveis aos valores da cultura e do espírito, capazes, nomeadamente, das intensas alegrias da arte. Homens sensíveis à beleza, oficiais de qualquer ofício que se não demitam, todavia, da sua responsabilidade de cidadãos. Pois que temos também por alvo uma formação moral genuína, baseada na prospecção curricular de TODAS as aptidões, na sua mobilização em tarefas escolares livremente aceites, exaltantes pelo inconformismo, pela criatividade e pela cooperação, pois não há educação verdadeira num atmosfera de egoísmo, rotina e coacção"
Estamos sempre a tempo, irmãos professores...
Como escreveu João dos Santos
“A minha convicção é de que as equipas só existem de facto, e só se tornam eficientes, se um objectivo pedagógico muito concreto for constantemente posto à discussão e elaborado por todos. Devo dizer que certas pessoas reagiram muito desfavoravelmente à proposta de discutirmos qual o núcleo de ideias dinamizadoras e o objectivo educativo das equipas, tomando-a por uma crítica às intenções e aos resultados obtidos. Não é a primeira vez que noto entre nós reacções deste tipo, ao apelo para uma reflexão sobre os meios e os fins de cada grupo de trabalho. Curiosa esta sensibilidade dos Portugueses ao apelo para a reflexão em conjunto!” [ver aqui ]